quarta-feira, 16 de julho de 2014

A Nova Retórica de Perelman, livro de Mieczyslaw Maneli

Introdução
A falência das diversas ideologias emergentes no século XX, como o socialismo, o liberalismo e o capitalismo, impõe a revisão de todas as bases das ideologias sociais e políticas, partindo, todavia, do presuposto de que não há verdade absoluta. A despeito disso, devemos procurar elementos de verdade, progresso humano, liberdade e tolerância em qualquer filosofia política e sistema sociopolítico.
A Nova Retórica é um instrumento que pode auxiliar na elaboração de novas formas de pensar e agir, de novas abordagens críticas para todas as instituições jurídicas, políticas e sociais, sejam elas do oriente ou do ocidente, apresentando-se como o método mais consistente para buscar novos caminhos.
Perelman reviveu as ideias de Aristóteles e as excedeu amplamente. Elaborou uma filosofia e metodologia direcionada contra as verdades absolutas e dogmas; contra também ao relativismo moderno nas teorias da política, dos valores, da lei e da moral, posto que tais conceitos são desastrosos para o pensamento acadêmico.
Apesar de inicialmente produtivo, o modo de pensar positivista desvirtuou-se na medida em que foi transformado em relativismo sem princípios e a lógica formal foi utilizada para propósitos meramente dogmáticos. Perelman manifestou-se contra esse raciocínio e resgatou a aristotélica diferença entre o racional e o razoável. Para Perelman, Descartes estava errado em afirmar que quando duas pessoas expressam ideias diferentes sobre a mesma situação social, pelo menos uma delas deve estar errada. Para a Nova Retórica, talvez ambos estejam certos e suas opiniões possam ser provadas no processo de diálogo e argumentação.
A grande máxima da Nova Retórica é entender possível e razoável elaborar e concretizar programas políticos ou sociais diferentes e contraditórios e, ainda assim, entender que ambos sejam, até certo ponto e por determinado período, benéficos para a sociedade. Os julgamentos que não se baseassem em categorias da lógica formal poderiam ainda assim ser razoáveis, e não irracional.
O diálogo na nova retórica não apenas tornou-se uma simples troca de ideias, mas uma categoria social que promove uma competição infinita de argumentos a fim de estabelecer a melhor solução possível para uma dada situação em um determinado momento. No entanto, quando um dos fatores da realidade muda, mesmo que por um pequeno lapso de tempo, surge uma causa válida para reabrir o diálogo e reavaliar a situação desde o começo, a partir de suas próprias raízes. Durante esse novo direcionamento, nada deve ser considerado sagrado ou estabelecido de forma definitiva. O diálogo na presença de uma audiência ilimitada torna-se um grande critério de verdade relativa e de soluções relativamente boas, mas que devem ser vistas apenas como temporárias. A natureza da nova retórica é compreendê-la e aplicá-la criativamente.
Perelman sustentava uma abordagem consistentemente antidogmática para a questão da verdade. E embora nunca subestimasse a lógica formal, hesitava em aplicá-la onde ela era inadequada, voltando para o pensamento plurista na busca de um novo conceito de argumentação e persuasão, criado para ser um instrumento de resolução de contradições sociais em escala interna, nacional e internacional.
Imerso no cenário de estagnação intelectual característico da guerra fria, Perelman condenava toda e qualquer forma de militarização na política e, nesse caso, onde a opção por soluções militares é excluída, as partes beligerantes devem ser persuadidas de que podem entrar num acordo, ainda que este não seja tão atraente para ambos, com base no diálogo retórico. "Nossa maior preocupação deve ser a necessidade de solucionar as inevitáveis contradições do mundo moderno de uma maneira pacífica. A maior virtude de qualquer estadita ou líder deve ser, portanto, sua habilidade de negociar e viver pela espada da persuasão e não a da aniquilação".
Cada estágio de nossa análise, investigação e justificação nos leva a determinadas conclusões que podem ser consideradas como verdade relativa ou absoluta. Tal verdade é uma reflexão parcial da realidade; é um ponto ou um estágio no entendimento dos processos que fazem parte da sociedade. Essa reflexão é incompleta e não pode ser uma apresentação e uma compreensão absolutamente correta dos acontecimentos porque nossas mentes são como espelhos com irregularidades. Por outro lado, essa verdade parcial, sempre o resultado da séria investigação e análise, faz parte do processo infinito de busca pela verdade absoluta, uma conquista que temos como objetivo e que seremos capazes de atingir com o tempo. A verdade absoluta no futuro será, de acordo com o ponto de vista retórico, a soma de infinitas verdades parciais. Dessa maneira, seremos capazes de combater dois tipos de perigo: o relativismo absoluto e o dogmatismo absoluto.
A modéstia e a tolerância são necessárias para todo pensador e estadista, para todo estudioso e político.

1 - Apresentação
Com a queda do comunismo e a desvelada frustração oriunda das democracias ocidentais, com seus modelos liberalistas ou facistas, a nova retórica apresenta-se como saída satisfatória para conciliar os antagonismos sociais. Na marxista visão da luta de classes, o papel da Nova Retórica é ainda mais importante, principalmente para sedimentar as mudanças políticas ocorridas no leste europeu com a queda da URSS. O destaque se comprova com a retórica de um diálogo havido na Polônia em 1988 e 1989 que contribuiu para enfraquecer a posição autoritária socialista naquele país. Isso é prova de que é bastante realista a crença da Nova Retórica na capacidade do diálogo para solucionar os conflitos mais agudos e complexos em determinadas situações. O poder da racionalização e da persuasão é capaz de vencer o terror cego e flagrante, seja ele ideológico ou físico. Em determinadas circunstâncias, o poder do bem moral e da razão pode se tornar decisivo no combate a forças maléficas, despóticas e reacionárias.
A nova retórica preconiza que devemos dirigir esforços para atingir a verdade relativa, soluções parciais e tentar ganhar algo razoável e consequentemente possível e atingível. Devemos analisar nossa situação de alto a baixo e, ou continuar a fazer o que estivermos fazendo, ou descartar as premissas mais amplamente aceitas, se estas se tornaram ultrapassadas. Não devemos temer que alguém nos diga que estamos errados ou que somos inconsistentes porque modificamos nossos métodos ou nossos objetivos. Não há virtude em ser teimoso, defender um curso equivocado ou continuar uma política cuja experiência não tenha crédito ou não sirva a interesses reais. Não devemos perseguir nada pelo bem da "firmeza", da "coerência", da "coesão" ou ainda pelo bem dos princípios. A nova retórica enaltece aqueles que hesitam, refletem e em seguida modificam o curso de sua ação. A única virtude moral e social é a nossa capacidade de reconsiderar, de entrar novamente num diálogo, de manter a mente aberta de ser flexível, de estar aberto a sugestões e estar disposto a seguir conselhos novos e razoáveis.
Na nova retórica, o objetivo do diálogo é separar o essencial do trivial e pesar os fatos e os julgamentos, não a fim de determinar um peso idêntico a eles, mas, pelo contrário, diferenciar seus valores e com isso ordenar o mosaico sem forma em uma entidade funcional e razoável, que pode ser utilizada para fins práticos e para pesquisa teórica adicional. Nos encontramos atualmente num grande cemitério histórico de ideias e de sistemas políticos e econômicos, porém, sem desesperos, devemos buscar valores que podem ser reavaliados, reutilizados, reciclados e reconstruídos num novo conjunto de projetos, leis e instituições apartidárias e suprapolíticas.

2 - As Origens e Bases da Nova Retórica
A nova retórica surgiu da necessidade premente de encontrar uma lógica de julgamento de valores que possibilitasse racionalizar sobre eles em vez de fazê-los depender exclusivamente de escolhas irracionais, baseadas no interesse, paixão, preconceito e mito.
Perelman não aceitava a utilização da lógica matemática para tratar dos temas inerentes às humanidades, e seus esforços intelectuais tiveram por resultado a "redescoberta" de um componente da lógica aristotélica que lidava com o raciocínio dialético, diverso do raciocínio demonstrativo, pois busca a lógica do razoável. A nova retórica tem servido assim, como um método para analisar os aspectos da vida que vão além dos moldes da lógica formal, sendo relegados a métodos normalmente distantes da aplicação da razão consciente.
A nova retórica possui três elementos básicos que constituem sua base metodológica como uma filosofia de racionalismo consistente: a) uma nova solução para a relação entre o razoável e o racional; b) o problema da audiência; c) o problema do diálogo.
A nova retórica vem contestar Descartes, que afirmava que, se dois homens possuíssem julgamentos contrários sobre o mesmo assunto, pelo menos um deles seria irracional e estaria enganado, embora ambos pudessem estar equivocados. Para a nova retórica, a pretensão cartesiana é excessiva e irracional, posto que ambas as partes podem possuir opiniões válidas e razoáveis, pois os problemas humanos, práticos, políticos e morais não podem ser reduzidos à antinomia, ao verdadeiro ou falso. Diversas opiniões podem ser razoáveis ao mesmo tempo porque há uma diferença entre o que é racional e o que é razoável.
A redução do racional a um princípio único nos leva ao pluralismo irracional ou ao monismo. Sistema utilizado pelos diversos regimes totalitários, cujas ações estiveram categoricamente justificadas pela lógica racional. Mas seriam tais condutas razoáveis? Seriam elas humanas?
A nova retórica não elimina a lógica formal e não rejeita o valor dos silogismos com relação à dedução e à indução, mas reserva um lugar apropriado para eles na totalidade do raciocínio humano. O conceito de razoável é inerentemente pluralístico, ele é incompatível com as pretensões do monismo ou do totalitarismo.
O racionalismo interpretado de forma restrita pode nos levar ao monismo e ao absolutismo; a busca pelo razoável, a uma visão pluralista do mundo. Segundo Bertrand Russell, "o homem racional seria simplesmente um mostro humano".
No tocante à teoria Pluralista do razoável, há um fator a mais que deve ser levado em conta, que é a sua mutabilidade. O razoável de ontem não é o razoável de hoje, pois o razoável se modifica à medida que a humanidade se modifica. O razoável se opõe à aceitação crítica da realidade estabelecida; ele promove a mudança pluralista; o racional pretende à estabilidade.
Mills chega a afirmar que a racionalidade justifica o status quo social e a insensatez conservadora a priori inimiga de qualquer inovação e do pluralismo democrático. O racionalismo moderno tende a caminhar para a uniformidade, enquanto o razoável sempre se opõe à uniformidade e enfraquece qualquer forma de ordem absoluta e promove o pluralismo entre todas as esferas da vida, no material e no espiritual, no econômico e no político.
Muitos filósofos desde Hume argumentaram que é impossível demonstrar que um conjunto de regras morais é preferível ao outro, ao que Perelman responde que se isso é verdade, deve-se então ampliar o domínio das investigações lógicas, para alcançar a lógica do razoável.
A nova retórica é uma teoria da argumentação para objetivos práticos, a fim de encontrar um modo de tomar decisões mais razoáveis, eficientes e justas, e que possam ganhar o maior apoio possível de um público dividido por diversas controvérsias. É uma teoria que nos auxilia conscientemente a tomar decisões práticas e ao mesmo tempo razoáveis, visando diretamente à ação.
O diálogo é a forma e a alma do processo da argumentação. O primeiro pré-requisito para a existência do diálogo é o interesse de pelo menos dois participantes na troca de ideias e na obtenção da adesão de intelectos. O segundo pré-requisito para a existência do diálogo é a liberdade dos participantes. Pode-se definir uma audiência, para fins retóricos, como o conjunto de pessoas que o orador deseja influenciar por meio da argumentação. O verdadeiro orador deve saber a arte da "adaptação contínua", a fim de garantir o caráter temporal da argumentação retórica. A nova retórica pressupõe um diálogo livre com um público livre do terror, o que não pode ocorrer no despotismo. A razão deve ser fortalecida pela nova teoria da argumentação e as soluções razoáveis devem ser pluralistas.
A lógica formal não questiona as premissas dadas, enquanto a nova retórica, por outro lado, é crítica em tudo. Ela não toma nada como certo, e não aceita nada que tenha sido estabelecido no passado sem questionamento. Os fatos designam o que foi acordado por uma determinada audiência como incontroverso, mas um fato pode deixar de ser um fato porque dúvidas foram levantadas sobre ele pelo público específico. Nesse aspecto, a nova retórica nunca dá conclusões, e a verdade, embora sempre em mutação, continua sendo algo tangível e aplicável porque é continuamente questionada em diálogos infinitos de audiências ilimitadas.
Sendo assim, estaríamos eternamente condenados à dúvida e à inquietação? Sim, mas na mudança há o descanso, e o que tende à destruição chama-se concordância e paz.
Concluindo, a nova retórica constitui uma base filosófica e metodológica para o conceito democrático do pluralismo. E vice-versa: o pluralismo nos leva à teoria da argumentação e necessita do seu apoio para sua própria existência. A teoria e a metodologia são inseparáveis dela. Essas considerações filosóficas e metodológicas gerais têm impacto direto sobre a filosofia do direito, a moral e a política.

3 - Nova Retórica e dialética
A dialética é a base e o sistema nervoso da Nova Retórica. Hegel apresentou uma forma geral de trabalho para a dialética de maneira completa e consciente, ao que Marx aproveitou amplamente os conceitos para erguer sua filosofia. Hegel analisou as diversas categorias da dialética e uma delas interessa de perto à nova retórica, que é a análise dialética da realidade e seu reflexo no espelho da mente, a dialética do geral para o particular, das categorias de pensamento como estágios de compreensão e domínio do mundo. O debate retórico é o meio de se aproximar da verdade num mundo em que tudo se origina na disputa, pois a guerra é comum a todos e é a base e o princípio de tudo, até mesmo da harmonia e da justiça. A contradição é a alma tanto da dialética como da retórica.
A lei rudimentar do pensamento retórico e dialético não aceita apenas uma análise superficial do objeto em debate, mas busca analisar as contradições mais profundas existentes em sua unidade. Segundo Heráclito, aprender muitas coisas não nos ensina a ter entendimento, muitos não pensam sobre as coisas que experimentam, nem sabem aquilo que aprendem, mas acham que sabem. Estamos enganados quando acreditamos em nossos sentidos e nos enganamos quando desconfiamos deles sem crítica, porque a natureza adora esconder e não revela facilmente seus segredos.
A dialética é um método que sustenta que fenômenos externos ocultam leis internas e essenciais. A retórica é o instrumento que desnuda a essência de suas formas equivocadas. E qual é a essência? Segundo a dialética, a essência são as contradições e expô-las aos ouvintes, o que pode ser estendido ao infinito. Todavia, o objetivo do diálogo retórico não é simplesmente estabelecer uma discussão infinita e brilhante, mas chegar a escolhas e decisões razoáveis. Por causa desses objetivos práticos, o diálogo retórico precisa impor restrições temporárias à essência dialética infinita e ao seu caráter multifacetado; e recomenda a aceitação de resultados preliminares, além de aprovar as aplicações práticas.
A grande novidade na teoria de Perelman, com relação à Aristóteles, é sua apresentação e elaboração da noção de audiência e pluralismo, seja na política, jurisprudência ou filosofia. Uma das inconsistências que a nova retórica pretende diminuir é o fato de que todo sistema normativo ser arbitrário e logicamente indeterminado. Perelman chegou a conclusão de que há uma imperfeição natural em todas as formas de sociedade, e se convenceu de que o diálogo seria a maneira pela qual a pluralidade das mentes imperfeitas atuam. O diálogo, concebido como interrelação entre o orador e a audiência, foi introduzido pela nova teoria da argumentação a partir de considerações pluralista e tornou-se um foco central da Nova retórica.
O problema político e filosófico central é que no meio social enfrentamos conflitos, e o mais difícil e essencial é a busca de meios para minimizar esses conflitos e equilibrar os antagonismos por meio de uma técnica social centrada na noção de convenção, que é o resultado do acordo entre pensamentos que estabelecem livremente uma ordem comum.
O pluralismo sempre busca o aprimoramento por meio de concessões, acomodação e síntese, e parte da premissa de que os indivíduos não devem levar seus interesses e convicções longe demais, eles devem ser moderados e prudentes. As pessoas podem viver juntas em equilíbrio, numa simbiose, cada uma buscando um modo de vida aceitável por todos, e todos os indivíduos podem preservar uma certa dose de liberdade e individualidade.
Duprèel, professor que inspirou Perelman, distinguiu o espírito crítico do espírito dogmático, sendo este caracterizado pela inclinação para rejeitar qualquer crítica ou questionamento, o que serve a propósitos de grupos conservadores, enquanto que aquele, o crítico, é a disposição para respeitar todas as verdades conhecidas ou a serem descobertas.
Concluindo, o conceito pluralista de sociedade política assimilado por Perelman é um conjunto de conclusões lógicas, racionalistas e razoáveis, baseadas no conceito dialético da disputa perene de contradições.
O diálogo é a forma e o ânimo de espírito do processo da argumentação. Há dois pré-requisitos para a existência do diálogo: o interesse do orador e da audiência na troca de ideias, e a liberdade dos participantes de serem sinceros uns com os outros, sem medo de expor o que pensam.
Num processo de persuasão, o ponto de partida não deve ser o indivíduo, mas sim o meio cultural em que ele está imerso. O orador deve mergulhar nesse mundo em busca de elementos comuns para edificar sua argumentação.
A retórica, contudo, não é a arte de utilizar meios imorais para fins imorais, eis que, considerando uma audiência universal, durante o fluxo da argumentação, as pessoas de livre pensamento logo detectarão os mentirosos e as falsidades tão necessárias para os desonestos. Não há garantia contra o erro, mas este será descoberto quando o interlocutor estiver livre para pensar, falar, coletar material e investigar o caso, quando ele estiver livre e preparado para fazer parte do processo da argumentação. A nova retórica deve ser uma arte de persuasão, com o fim de obter a adesão de pessoas comuns, que podem não ser anjos, mas que também não são demônios, e que, pelo menos, têm a boa vontade de começar a pensar sobre determinado assunto.
No século XX o senso comum deixou de ser um instrumento contra distrações do próprio senso comum por ter sido erigido a uma categoria da lógica e servir às nefastas propagandas dos poderosos, sendo um dos piores e mais perigosos inimigos da razão nas democracias industriais modernas. A retórica é uma maneira de sobrepujar o poder das aparências, dos dogmas, dos mitos e das "verdades óbvias" do senso comum, sendo um convite ao diálogo de pessoas que são críticas, inovadoras e criativas em suas vidas profissionais, mas que são incapazes de aplicar os mesmos critérios de exigência em análises de assuntos políticos e sociais. A lógica formal não questiona as premissas, mas sim aceita conceitos tradicionais mesmo que novas circunstâncias já os tenham invalidado. Já a retórica examina todas as coisas.
Os fatos e a verdade são duas ideias muito importantes para entender a relação entre a nova retórica e o pluralismo. Segundo Hegel, a verdade é infinita, eis que concebida como um processo dialético de reflexão sobre a objetividade, realizado pela mente subjetiva, pelo que impor limites à verdade seria negá-la. Assim, toda verdade é somente parcial. Mas a verdade parcial é sempre verdade, pois abrange parte da verdade absoluta, que a humanidade apenas alcançará na eternidade. O estágio determinado do conhecimento humano envolve uma soma de verdades objetivas parciais e esse conhecimento pode ser fundamental para atividades práticas. O avanço na descoberta e domínio dessas verdades parciais é a própria evolução do pensamento, a qual consiste em novas descobertas das leis desconhecidas da natureza, de associações, relações e interdependências desconhecidas. Todavia, é bom ressaltar, nem toda verdade relativa nos leva a uma verdade superior, sendo este o verdadeiro perigo a que toda verdade relativa nos expõe. Aqui entra a nova retórica, que procura diminuir o risco real de erros.
Já os fatos são certos tipos de dados baseados na realidade objetiva, eles designam o que foi acordado como incontroverso por uma determinada audiência. Todavia, nenhuma afirmação pode estar segura de gozar definitivamente desse status. Não há nenhum critério derradeiro que torne algo um fato independente da atitude do ouvinte, posto que só se tornam fatos no processo da argumentação quando são aceitos e tratados como tal. Um fato que é alvo de argumentação nada mais é do que uma reflexão subjetiva da realidade objetiva, desde que não seja impugnado pela contra argumentação de seus adversários.
Fatos x Verdades: o termo fatos geralmente é usado para designar objetos de acordo preciso e limitado, enquanto o termo verdade é geralmente empregado em sistemas mais complexos relacionados a conexões entre os fatos. A verdade está relacionada com a "realidade objetiva", com sua avaliação, com sua percepção, e finalmente com a atividade prática que dialeticamente influencia na realidade. A teoria da argumentação, com seu conceito discursivo de fatos e verdades, é inteiramente dialética: não sustenta nada sagrado, nada estabelecido, nada tido como certo. E a dialética, por sua vez, pede um diálogo retórico porque essa é a única maneira de preservar sua existência. A dialética e a retórica representam os dois lados do método democrático de pesquisa num ambiente politicamente livre, ambos necessitam da democracia política, assim como a democracia política não pode existir e se desenvolver sem eles.
A cultura ocidental geralmente sustenta que qualquer conclusão alcançada pelo pensamento humano deve ser uma convicção subjetiva e pessoal, além de que toda conclusão deve ser examinada e resultar de uma investigação, não apenas de uma crença cega, o que também é o ideal do discurso retórico. A argumentação retórica nunca termina, ela não conhece interrupções, pausas ou intervalos. Toda verdade é continuamente questionada numa busca por contradições e harmonia.
A ligação intrínseca entre a metodologia retórica, a dialética e o pluralismo é a premissa de que não existe nada perfeito, sendo que a nova retórica constitui uma base filosófica e metodológica para o pluralismo. É um instrumento de análise e síntese, sendo uma criativa atividade social.
A nova retórica não considera todos os ideais filosóficos, legais, sociais, políticos e morais sem sentido ou sem valor. Apenas submete esses ideais, sua interpretação e sua aplicação à pesquisa científica incessante. cada vez mais estamos desenvolvendo a capacidade de encontrar uma terceira, quarta ou quinta solução, porque nossas vidas e nosso sistema social e político não estão confinados a apenas dois extremos. O método da nova retórica é contra o dogmatismo mas sim é a favor do pluralismo, da democracia e da liberdade intelectual ilimitada.
Pela sua própria natureza, a dialética é crítica e revolucionária, mas a experiência mostra que até mesmo a dialética pode ser usada para fins não humanistas e antiprogressistas, pois ela não tem sido usada apenas como arma da crítica, mas também como meio de impor ideais absolutos e dogmas, muitas vezes de forma oculta e perversa, pois apresentam, na prática, uma forma mais amena de ideias absolutas. A nova retórica, ao contrário, sustenta que as decisões devem ser tomadas com base em premissas retoricamente aceitas, nos fatos e nas verdades, e todas as coisas relacionadas a eles devem ser passíveis de debates em todos os estágios.
A concessão por si própria é um resultado da sociedade pluralista e ajudam a promover o desenvolvimento das instituições democráticas, na medida em que são resultados inevitáveis do completo desmembramento dos fatos e argumentos que circundaram a questão. No campo das contradições, da pesquisa e dos argumentos deve haver um acordo sobre as proposições fundamentais, ao menos isso.
Concluindo, sendo uma teoria e metodologia, a nova retórica funciona como um instrumento realista para suprir a lacuna entre o pensamento dialético e a atividade prática na sociedade moderna.

4 - A visão retórica do poder e da autoridade
A distinção entre autoridade e poder não é geralmente aceita no campo das ciências políticas. Todavia, trata-se de importante diferenciação para a teoria da nova retórica. Autoridade é o que autoriza, enquanto o poder é o que capacita. Portanto, na autoridade há elementos de moralidade que não existem necessariamente no poder, estando este ligado à dominação, enquanto a autoridade se baseia na superioridade moral. O poder exercido sem autoridade está nas mãos de bandidos e de tiranos. Santo Agostinho afirmou que o poder supremo não controlado pela justiça nada mais é do que summa latrocinia (roubo entronado). Todo poder sem autoridade é injusto e separar o poder da autoridade é como separar a força da justiça. A autoridade sempre tem aspectos normativos e o poder sem autoridade leva o indivíduo à submissão e não ao respeito.
A nova retórica, portanto, é mencionada por ele como um instrumento que somente deve ser usado mediante poderes democraticamente constituídos responsáveis pela direção humana e progressiva de uma comunidade política organizada, pois a força não pode e não deve ser o único e verdadeiro motivo de obediência. Todo poder deve tentar agir como autoridade e ser considerado uma autoridade. isso significa que ele deve gozar de respeito, mas o respeito não vem por si próprio, ele deve ser conquistado. E é aí que entra a nova retórica, como o seu papel de conquistar ou ampliar a adesão de opiniões aos argumentos do locutor e, dessa forma, exercer uma influência significativa sobre a política e sobre a evolução democrática. Contudo, ela não pode servir como meio para obter a adesão ao autoritarismo insensato, baseado no poder físico, que somente consegue atrair o povo com base na intimidação.
Para Perelman, tão logo o poder torne-se mera expressão de uma relação de forças, uma força revolucionária que sirva a interesses antagônicos pode contrapor-se imediatamente a ele, para defender uma nova ordem, que será mais justa e humana, que salvará o homem de todas as suas formas de alienação e devolver-lhe-á a sua liberdade perdida. Vislumbra-se aqui o papel político da Nova Retórica, eis que se trata de um instrumento capaz de auxiliar na elaboração de uma nova ideologia mais compatível com a dignidade humana e a liberdade, e que pode dessa forma ganhar e aumentar a adesão da maioria. Esse é o ciclo do desenvolvimento social e político e não importa se os diversos estágios desse desenvolvimento sejam chamados de revolução ou reformas, cujo melhor exemplo é a morte relativamente pacífica do comunismo na Europa Oriental.
Concluindo, uma crítica da ideologia dominante pode ser feita somente por outra ideologia, sendo que esse conflito de ideologias constitui a base de nossa vida espiritual contemporânea. Negar o conflito entre as ideologias é nutrir o dogmatismo e a ortodoxia e permitir ao poder político dominar o universo do pensamento.

5 - O Curso da Argumentação
Os primeiros objetivos no processo do discurso devem ser estabelecer as ideias essenciais do interlocutor e descobrir seus objetivos verdadeiros. Quando entramos numa discussão com alguém que expressa ideias aparentemente desconexas, que parecem ser ilógicas e filosoficamente incoerentes, devemos estabelecer o verdadeiro senso lógico e as bases que sustentam as palavras dessa pessoa, a tal ponto que talvez ela mesma não compreenda claramente.
O orador deve sempre ter em mente que o conservadorismo é mais poderoso que as ideias inovadoras, eis que defendem algo que já existe, e segundo Hegel, tudo que existe é razoável.
O objetivo do diálogo retórico e do processo da argumentação não é encontrar um meio termo ou dividir as diferenças. O objetivo é, se possível, conseguir o apoio de toda a audiência aos nossos argumentos ou, pelo menos, ganhar seguidores para nossa causa apresentada e justificada. O diálogo retórico não é um processo de negociação.
A identificação do centro como uma posição de meio termo deve ser cuidadosamente analisada para que tenha certeza que o tal centro é de fato o centro. A posição centrista pode ser útil e razoável, mas sua racionalidade deve ser provada não apenas com base na conveniência transitória, nos benefícios pragmáticos temporários ou na conveniência linguística.
Para a nova retórica, o objetivos do diálogo é ganhar a adesão da audiência, a fim de perseguir nossos objetivos práticos. O termos adesão é importante para a compreensão do conceito sustentado pela nova retórica. Dizer que um orador provocou a adesão da audiência, não significa dizer que ela mudou necessariamente sua filosofia, ideologia, religião, ou qualquer outra opinião; mas significa que ela deve cooperar com o orador num futuro próximo e previsível, a fim de atingir certos objetivos comuns estritamente definidos.
No processo de obtenção da adesão, além do espírito e atitude geral da audiência, devemos levar em conta também seus sentimentos complexos, combinados e até contraditórios. Tanto que os grandes líderes de qualquer país são criados pelos acontecimentos à imagem do seu próprio povo, suas verdadeiras características e desejos.
Para Perelman, ideias vagas podem contribuir para o desenvolvimento da sociedade. Tais ideias materializam-se na posição centrista, que mesmo sendo possivelmente confusa e vaga, pode representar um plano ou projeto realizável. Pode ainda ser utilizada para ganhar tempo, até que decisões mais razoáveis e esclarecidas possam ser tomadas. Para Hegel, a história deve se repetir duas vezes, o primeiro movimento para o progresso evolutivo será seguido por um segundo movimento, com a finalidade de convencer as pessoas de que o advento dos novos tempos é inevitável e que eles não devem lamentar o final da primeira fase.
É fato que, sem maior participação social ativa no processo político, o sistema democrático ficará enfraquecido e poderá decair, eis que o principal critério para determinar se um sistema democrático funciona normal e eficazmente é a participação consciente do público no processo da tomada de decisões políticas. Do ponto de vista retórico, o público deve aderir razoavelmente a certas ideias e decidir frente a um conjunto de alternativas, mas deve, todavia, sentir-se livre para mudar de opinião sempre que achar que a situação e as circunstâncias tenham se modificado. A nova retórica lastreia essa atividade prática, que exige fazer escolhas e vencer obstáculos, porém nunca teve a intenção de ser um mero sistema metodológico e filosófico, mas de ser um instrumento que promova a atividade razoável e prática à luz da razão.
A nova retórica, além disso, busca lastro em valores, princípios ou normas que tenham a vantagem de não terem que ser justificados, não porque sejam autoexplicativos, mas simplesmente porque não são contestados. Tais normas podem ser objeto de um acordo geral. Todavia, tal acordo geral não deve vincular os participantes do debate, principalmente se passarmos a discussão do plano abstrato para o concreto, o que é uma regra intelectual e social básica.
O novo dilema de Caim: Após a década de 1950, o debate sobre a responsabilidade do indivíduo sobre seu próximo ganhou relevo, principalmente em temas como a proteção ao meio ambiente e energia nuclear, mesmo que a esfera de ação sejam além das fronteiras nacionais, eis que estão em jogo a saúde, a vida e o bem-estar da humanidade. Estamos entrando lentamente numa fase em que o controle das pessoas mais esclarecidas sobre aqueles moralmente deficientes tornou-se necessária. Todos nós estamos interessados em assegurar governos democráticos em todos os países do mundo. Tal preocupação não deve ser considerada uma tentativa de interferir nos assuntos internos de um país, mas um ato de autodefesa por parte das nações e de toda a humanidade.
Os imperativos de Kant, o cristianismo judaico e os preceitos humanistas de moral ainda são válidos. Quando se tem amor ao próximo, deve-se ajudá-lo a ficar livre da ameaça de ditadores irresponsáveis. Com o intuito de salvar as nações e a humanidade do desastre, devemos empregar novos processos de pensamentos e de discussão, um método de argumentação e persuasão novos, essa é a filosofia e a metodologia da nova retórica: não podemos deixar nem mesmo uma só pedra de crenças tradicionais intocadas.

6 - Política, lei e Moral - Uma nova fase.
Há um cinismo crescente no mundo no que diz respeito à relação entre moral e política, eis que o povo está convencido de que essa ligação foi rompida, haja vista os políticos parecerem se importar cada vez menos com os padrões morais. As pessoas acham que questões morais não podem ser discutidas de uma forma verdadeiramente acadêmica, pois estariam além da razão, e seriam arbitrárias e baseadas num sistema de valores a priori.
Apesar disso, uma série de leis humanitárias estão sendo postas no mundo no sentido de positivar determinados preceitos morais. Como consequência, podemos perceber uma estreita interdependência entre política e moral, contrariando a sabedoria popular.
O Jogo político está estabelecido em duas dimensões. A primeira refere-se a grande questão da orientação política e a direção fundamental do desenvolvimento social e econômico, e são questões de suma importância pois têm o condão de influenciar drasticamente o futuro das gerações. A segunda dimensão está relacionada com as lutas políticas do dia dia, por posição, honrarias, lideranças, e votos. É onde vigora as intrigas, mentiras, meias verdades e todas as outras armas moralmente reprováveis, mas largamente utilizadas pelos políticos, em busca do sucesso. Até então, decisões corretas e eficazes ma primeira dimensão faziam os deslizes da segunda caírem no esquecimento. Atualmente, tudo se torna muito mais complexo porque há uma ligação direta com relação à moral entre o segundo e o primeiro tipo de política. Não se consegue definir com precisão o que seria um grande governo, nem uma péssima decisão. O curso dos acontecimentos impôs novas exigências na moral de decisões políticas, a exemplo do princípio da moralidade no direito administrativo brasileiro.
Atualmente, é cediço que apesar da vontade subjetiva de determinados políticos, eles são obrigados a tomar decisões compatíveis com as exigências amplamente compreendidas da moral. A necessidade de pelo menos aparentar um comportamento moral na política nesta época de comunicação de massa torna-se cada vez mais incontestável.
Contudo, a extensão dos efeitos das transgressões morais dentro da política, depende da percepção de cada sociedade, que pode mandar prender o político corrupto ou simplesmente deixá-lo impune.
Eis a essência da nova relação entre a política e a moral: a falta de vigor moral leva ao detrimento político, não a sua queda. Quando os atos não correspondem aos padrões de moral, a condenação nacional e internacional logo se segue. Esse princípio está se tornando gradualmente uma regra de ouro das relações políticas e da moral e sua observação é necessária para o sucesso na política.
O fato de que as normas morais têm uma natureza bastante genérica é uma das razões pela qual alguns filósofos e lógicos sustentam que as normas morais devem ser arbitrárias e que não podem existir princípios morais de base científica ou diretivas razoáveis de comportamento moral. Todavia, com base nos novos preceitos do direito nacional e internacional aceitos em todo o mundo, são importantes as atividades e normas que objetivem a felicidade máxima do indivíduo, com proteção à vida e à saúde da sociedade acima de tudo; a proteção à privacidade individual, à liberdade, e à tolerância; a proteção aos direitos humanos definidos pelo conjunto de tratados internacionais; a luta internacional ativa contra criminosos e crimes contra a humanidade.
Esses princípios morais devem ser considerados como o resultado do desenvolvimento de todo o curso da nossa civilização no ocidente, de nossa filosofia e jurisprudência, da atividade governamental, dos legisladores regionais e do direito internacional. O reconhecimento das normas e sensibilidades morais nos leva à legislação moderna nacional e internacional, que não aceitam que governos praticantes de genocídio se escondam atrás do muro da soberania.
Um dos conceitos básicos da moral grega e judaico-cristã deve ser revisado: o das boas intenções subjetivas, ou o da boa vontade kantiana, pois não são critérios suficientes da moral. Por exemplo, a defesa de criminosos de guerra que agiram por ordem superior ou de boa fé não é aceita por si própria. O grande avanço nas relações entre a moral, a política e a jurisprudência foi, por exemplo, a possibilidade de haver crime de genocídio por omissão, caracterizando uma das novas responsabilidades morais que permearão o mundo moderno. Assim, as normas morais se apresentam menos genéricas e ambíguas, mais precisas, mais diretas, mais concretas e mais fáceis de ser aplicadas.
Concluindo, já que é impossível fugir de dilemas morais e políticos, devemos utilizar o poder do pensamento e da argumentação para resolvê-los da maneira mais humana e racional possível. A nova retórica existe para aprimorar a compreensão de escolhas.

7 - Leis Sociológicas
No final do século XIX, os pensadores alemães sustentavam que existiriam dois tipos de ciência: as naturais e as sócio-históricas. As naturais descobrem leis naturais e generalizam os fatos empíricos pesquisando e encontrando uniformidade. As ciências históricas, por seu turno, não podem generalizar fatos históricos sociais ou políticos, pois se interessam por fatos específicos e concretos, que nunca poderão ser duplicados, pelos que são imprevisíveis. Segundo esses cientistas, o estudo da história apenas serve para acumularmos conhecimento, que, ao final, não nos ensinará nada, pois não vamos poder utilizá-los na tomada de decisões que envolvam novos fatos.
Perelman rejeitou essa distinção. Ele acreditava que nos dois tipos de ciência devemos estudar fenômenos que se repetem e encontrar estruturas e regularidades semelhantes que nos permitam considerá-las como padrões de um tipo de fenômeno. Sendo que os historiadores buscam generalidades no curso dos acontecimentos. Eles limitam suas investigações àqueles elementos, acontecimentos ou aspectos que, de acordo com sua escala de valores, possam ser considerados significativos e dignos de serem considerados fatos históricos, porque eles estão convencidos de que os futuros políticos, ativistas sociais e filósofos aprenderão algo se os conhecerem. Todavia, pode, e deve, haver discordância entre o que seria ou não um fato importante. O agrupamento dos fatos históricos em categorias nos permite prever o curso dos acontecimentos e avaliar o planejamento político e a programação social. Os historiadores fazem exatamente o que uma pessoa inteligente de bom senso faria. Eles partem de fenômenos específicos que ocorreram em determinado momento e tentam estabelecer os traços característicos de um dado período histórico. Para Perelman, as categorias históricas nos permitem organizar o conhecimento histórico.
Após o colapso do comunismo e no final da guerra fria, as pessoas continuam vivendo num mundo de velhos demônios e contradições, pois foram incapazes de lidar crítica e realisticamente com a nova situação. A nova retórica, desde o início, tentou persuadir as pessoas a não tomar posições extremas na análise das situações hostis. A ideia geral da nova retórica é considerar os elementos razoáveis presentes em todas as ideologias.

Ajude o Blog! Clique na figura abaixo para comprar o seu exemplar deste excelente livro!
*Ao clicar no local indicado, você será direcionado ao site da Amazon (a maior varejista de livros do mundo). Um percentual (em média 9%) do que você pagar volta para o blog.
 
 

terça-feira, 15 de julho de 2014

Redação nota 1000 (ENEM 2013)

Segue o espelho da minha redação no ENEM 2013, a qual foi uma das 481 provas avaliadas pelo MEC como nota 1000.
Como se pode notar não é um texto belo e primoroso, mas procurei observar cada um dos critérios de avaliação constantes no guia da redação divulgado pelo MEC. Por isso, acredito que este post possa ser de grande utilidade para os vestibulandos formarem sua convicção sobre o que o MEC espera encontrar na prova de redação.
Obs. Clique nas imagens para amplia-las.


quinta-feira, 6 de março de 2014

Introdução ao Estudo do Direito, de Tércio Sampaio Ferraz Jr. -Capítulo 01 - A universalidade do fenômeno jurídico

Introdução
Na antiguidade, a legislação enquanto trabalho do legislador não se confundia com o direito enquanto resultado da ação. Havia diferença entre lex e jus, eis que a lex condicionava o jus, e este era condicionado pela virtude do justo (Justiça).
Com a modernidade, passa a valer a figura do homo faber, e o direito se volta para a realização de fins, como a imposição de uma vontade sobre outra. O significado que deveria ser dado pela ação, pelo pensar, pela política, pelo agir conjunto, passa a ser dado por uma relação funcional de meios e fins.
O homo faber degrada o mundo, porque transforma o significado das coisas numa relação meio/fim, numa relação pragmática. Esvazia-se o conteúdo da decisão e transforma os fatos sociais, como o direito, em um fim em si mesmo. O homem deixou de ser um animal político para ser um animal construtor, e portanto apenas se relaciona bem com outras pessoas trocando produtos com elas. A troca de produtos, assim, torna-se a principal atividade política, e o Direito apenas mais um produto produzido pelo homem, e pelo qual o homem se mostra. O direito transmutou-se em um sistema neutro que atua sobre a realidade de forma a obter fins úteis e desejáveis. O que na antiguidade era ação, e na era moderna passou a ser trabalho produtor de normas, no mundo contemporâneo torna-se produto de labor, ou seja, objeto de consumo ou bem de consumo. E o homem que labora torna-se isolado do mundo, eis que sua produção independe do mundo em si, numa busca pela sua simples sobrevivência. Todos os homens, pela sua força produtiva e pelo seu consumo de bens, tornam-se simples meios, ou peças, dessa engrenagem.
De igual forma, o Direito torna-se mero instrumento de atuação, de controle, de planejamento, tornando-se a ciência jurídica um verdadeiro saber tecnológico. Deixa de assentar-se sobre a natureza, sobre o costume, sobre a razão, sobre a moral e passa reconhecidamente a basear-se na uniformidade da própria vida social, da vida social moderna, com sua imensa capacidade para a indiferença. Indiferença, inclusive, quanto às divergências de opinião, construindo-se uma ideia de tolerância passiva, que aceita todas as inconstâncias de um direito como produto, como se fosse a maior das virtudes.
Todavia, segundo o autor, essa forma compacta de direito instrumentalizado, uniformizado e generalizado sob a forma estatal de organização, é possível, venha a implodir, retornando as manifestações espontâneas e localizadas, típicas de um direito de muitas faces, peculiar aos diversos grupos e pessoas que o compõe. Assim, ter consciência dessa mecanização do direito não se perfaz um momento final, mas sim um ponto de partida e um convite a pensar o direito, como objeto de reflexão, e vivê-lo com prudência.

1 - A universalidade do fenômeno jurídico
O Direito apresenta-se na sociedade como um objeto de várias faces, ora servindo de consolo e fonte de guarida aos fracos e injustiçados, ora servindo como instrumento de dominação e controle, ante sua intricada tecnicidade. Essa aparente incongruência torna deveras tormentosa a redação de uma definição precisa do que seria o direito. Um dos caminhos a serem seguidos é, sem dúvida, o estudo das origens do nome direito em seus registros mais remotos, a exemplo da clássica dicotomia entre jus e derectum. Na antiguidade clássica, os símbolos relacionados ao direito variavam desde a deusa Dike, na Grécia, segurando a balança (sem o fiel ao meio) e a espada, com os olhos bem abertos, a deusa Iustitia, em Roma, que segurava sua balança (dotada do fiel) com as duas mãos, de pé e com os olhos vendados, declarando o direito quando o fiel estivesse completamente vertical, ou seja, direito, rectum, de+rectum. As diferenças simbólicas, por mais sutis que sejam, indicam os traços característicos desses dois povos, com os gregos traçando uma concepção mais abstrata, especulativa e generalizadora, com pouco apelo prático, e os romanos dando mais ênfase juntamente ao oposto, à prática, sem a elaboração de teorias abstratas sobre o direito. Como a palavra derectum continha um apelo visual mais notório, em razão de significar a retidão dos pratos da balança, esta era mais utilizada nos texto mais populares, enquanto que a palavra jus era restrita aos textos mais eruditos. A partir do século VI, no entanto, houve uma virada e a palavra derectum passou a significar o ordenamento jurídico ou uma norma jurídica em geral, e a palavra jus carregou o significado daquilo que é consagrado pela justiça, em termos de virtude moral. No Brasil, a expressão direito albergou ambos os significados, tornando o problema da definição desse verbete dos mais difíceis para o teórico, mas fundamental para a correta abstração do objeto em estudo.

Tem-se a crença de que a língua é um instrumento que designa a realidade, por meio da qual poderemos abstrair conceitos sobre a essência das coisas. Os autores jurídicos, em sua maioria conservadores, admitem a possibilidade de com uma palavra poder significar os conceitos e ideias relacionadas ao direito, mas a dificuldade é notória e se apresenta inclusive nos usos mais corriqueiros da palavra direito, como ciência do direito, meu direito foi violado, o direito brasileiro não permite a pena de morte, direito civil, etc. Do grande leque de realidade que uma definição pode abarcar surge seu maior problema, eis que ou são demasiado genéricas e abstratas, imprestáveis para traçar-lhe os limites, ou são muito circunstanciadas, o que faz com que percam sua pretendida universalidade. A filosofia analítica, por sua vez, apresenta uma concepção convencionalista da língua, que busca definir os usos corriqueiros dos conceitos, ao invés de buscar a natureza ou essência de alguma coisa, pois esse tipo de questionamento não teria sentido. Para os convencionalistas, por outro lado, só há um dado irrecusável, o de que os homens se comunicam, quer queiram quer não, posto que ao comunicar que não se comunica o homem já estará se comunicando. Em se tratando do termo direito, ele comporta várias significações e usos sintáticos, pelo que se pode dizer que é um termo denotativa e conotativamente impreciso, caracterizado pela ambiguidade e vagueza semânticas. É impossível no uso comum enunciar todos os casos em que a palavra pode ser usada, daí a sua natural ambiguidade. Desse modo, qualquer definição para o vocábulo direito seria considerada persuasiva, ante a forte carga emotiva que a palavra carrega.

Assim, se faz necessário redefinir o termo direito, a fim de melhor adequá-lo aos propósitos de um manual de introdução ao seu estudo. Tal intento, contudo, esbarra numa circunstância inerente à ciência jurídica, que tem seu objeto de estudo como um resultado de sua própria prática interpretativa, e sua análise depende da própria aplicação de sua teoria. A ciência jurídica não apenas informa, mas também conforma o fenômeno que estuda, faz parte dele. E ela faz isso sob diferentes enfoques, a exemplo do enfoque zetético e do enfoque dogmático. Um dos enfoques se preocupa com o problema da ação, de como agir, pois parte de uma solução já dada. O outro, por sua vez, está preocupado com um problema especulativo, de questionamento global e progressivamente infinito de premissas. A palavra zetética vem de zetein, que significa perquirir; enquanto que dogmática vem de dokein, que significa ensinar, doutrinar. Questões zetéticas têm uma função especulativa explícita e são infinitas, e estão relacionadas a busca sobre o que é o ser. Questões dogmáticas têm uma função diretiva explícita e são finitas, e estão relacionadas a busca sobre como deve ser algo. No enfoque zetético as premissas podem ser trocadas, caso se mostrem inservíveis, o que não ocorre no enfoque dogmático, pois se as premissas não se adaptam aos problemas, estes são vistos como "pseudoproblemas" e, assim, descartados, e não há a possibilidade de deixar soluções em suspenso. Com relação aos pontos de partida, uma investigação zetética parte de evidências e deixa de questionar certos enunciados porque os admite como verificáveis e comprováveis, já a investigação dogmática não questiona suas premissas, porque elas foram estabelecidas como inquestionáveis. A evidência está relacionada a uma verdade, e a dogmática está relacionada a uma dúvida que, não podendo ser substituída por uma evidência, exige uma decisão. O dogma impõe uma certeza sobre algo que permanece duvidoso.

O direito penetra em diversos ramos do conhecimento, e alguns deles propõe um enfoque necessariamente zetético. São disciplinas como sociologia, antropologia, psicologia e história, e todas admitem no âmbito de suas preocupações um espaço para o fenômeno jurídico. Seu caráter zetético advém da abertura constante para o questionamento dos objetos em todas as direções (questões infinitas). A zetética analítica pura ocupa-se com os pressupostos últimos e condicionantes bem como com a crítica dos fundamentos formais e materiais do fenômeno jurídico e de seu conhecimento. A zetética analítica aplicada ocupa-se com a instrumentalidade dos pressupostos últimos e condicionantes do fenômeno jurídico e seu conhecimento, quer nos aspectos formais, quer nos materiais. A zetética empírica pura, por sua vez, ocupa-se do direito enquanto regularidades de comportamento efetivo, enquanto atitudes e expectativas generalizadas que permitam explicar os diferentes fenômenos sociais. E, por fim, temos a zetética empírica aplicada, pela qual o teórico ocupa-se com direito como um instrumento que atua socialmente dentro de certas condições sociais. Assim, a zetética jurídica corresponde às disciplinas que, tendo por objeto não apenas o direito, podem, entretanto, tomá-lo como um de seus objetos precípuos.

Por outro lado, uma disciplina pode ser definida como dogmática quando considera certas premissas arbitrárias (no sentido de que são simples resultados de uma decisão) como vinculantes para o estudo. Trata, portanto, de questões finitas, que são regidas pelo princípio da inegabilidade dos pontos de partida, construído por Niklas Luhmann. Em uma primeira análise, pode-se imaginar que a expressão "dogmática" imporia uma restrição demasiada ao trabalho do jurista teórico, que, presumidamente, estaria tolhido pelos pressupostos delimitadores. Em verdade, é certo que o direito vivenciado nas universidades vem sofrendo um crescente processo de dogmatização, pelo qual se dá pouca importância aos seus aspectos menos técnicos. Mas tal posicionamento pode ser justificado se considerarmos que existe uma dupla abstração no processo de conhecimento e aplicação de uma norma jurídica, uma para definir qual norma aplicar ao caso e outra para definir quais as regras de interpretação válidas para abstrair o conteúdo da norna ora aplicada. Caso essas abstrações não fixem pontos de partidas estanques, corre-se o risco de distanciar-se progressivamente da realidade que se pretende normatizar. Por outro lado, os próprios pontos de partida, fixados na ciência dogmática, podem e devem ser interpretados de forma crítica. Assim, o jurista, ao se deparar com um dogma, deverá dar a ele interpretação consoante a utilidade que pretende àquela norma. Esse processo de interpretação, por si só, já liberta o jurista para exercer seu ofício em um nível menos vinculado. O saber dogmático retoma assim a análise das incertezas que justificaram a própria criação dos dogmas, ampliando-a, mas de modo controlado. O controle se refere ao fato de que não é admitida qualquer interpretação para uma norma jurídica, mas apenas aquela interpretação que resultam de uma argumentação conforme aos padrões dogmáticos. O livro seguirá analisando o direito como objeto dogmático, porém com um enfoque notadamente zetético de como a dogmática conhece, interpreta e aplica o direito, mostrando-lhe as limitações.

Ajude o Blog! Clique na figura abaixo para comprar o seu exemplar deste excelente livro!
*Ao clicar no local indicado, você será direcionado ao site da Amazon (a maior varejista de livros do mundo). Um percentual (em média 9%) do que você pagar volta para o blog.