terça-feira, 3 de novembro de 2015

O problema da massificação das identidades em Amartya Sen

Em sua obra "As pessoas em primeiro lugar", o prêmio Nobel de economia Amartya Sen discorre sobre vários temas relacionados à efetivação de direitos, modelos políticos e papéis do mercado.
Um ponto interessante discutido no livro é a relação entre a imposição de padrões de identidades e a negação de direitos humanos a comunidades religiosas, étnicas e político-sociais. Segundo o autor, Samuel Huntington impactou o mundo ocidental com a ideia do "choque de civilizações", segundo a qual as pessoas de diferentes povos não interagiam com as pessoas em si, mas sim com os padrões previamente idealizados para àquele determinado grupo social. Então, fala-se do mundo islâmico, do mundo cristão, do mundo budista olvidando-se que a fé religiosa de alguém não resolve em si mesmo todas as decisões que essa pessoa tem que tomar ao longo da vida.
Para Sen, esse processo de negação de identidades viola o direito humano de ver a nossa identidade do jeito que escolhemos. Tal direito parece ser mais um corolário da premissa kantiana de que a pessoa deve ser enxergada como um fim em si mesmo, pois do contrário, em se lhe negando a autonomia de escolher como o mundo deve enxergá-la, estar-se-á diante de um mero instrumento estatístico para avolumar a representatividade deste ou daquele grupo. Esta ideia também está de acordo com a perspectiva pós-moderna de enxergar o mundo por meio da fragmentação de sua complexidade. E o autor vai dizer ainda que essa padronização de grupos é a causa de inúmeras violações de direitos ao longo dos anos, principalmente em fatos recentes, como o 11/09 e a invasão do Afeganistão e do Iraque. Muitas vidas estão sendo perdidas pela desconsideração da pessoa em si. 
"A imposição de uma identidade não refletida pode matar como a peste"
O caminho para um nível maior de harmonia entre os povos (ou mesmo para a criação de alguma harmonia no mundo) passa pelo reconhecimento de que somos "diversamente diferentes", enquanto pessoas e não apenas enquanto povos ou grupos religiosos. 
Relembrando a lição de Bourdieu, Amartya Sen vai dizer que uma categorização socialmente formulada acaba por produzir uma diferença onde não existia nenhuma. Ou seja, ao invés dos pré-juízos serem consequências dos fatos históricos, em verdade deles são as causas.
Não se pode classificar as pessoas segundo determinados estereótipos, muito menos partir dessa classificação para estabelecer a forma de interação que se terá com ela. Não se pode deduzir do fato de uma pessoa morar em uma favela brasileira a conclusão de que ela é criminosa. Não se pode achar que a honestidade tem uma cor ou uma posição social (vide nosso políticos). Eis aí uma das causas do preconceito que ofusca o brilho da diversidade brasileira.
Como diz Bourdieu, a massificação das identidades cria uma armadilha: a de que a própria pessoa se convença de o grupo corresponde e determina a sua identidade, e passe a conduzir suas ações irrefletidamente segundo os estereótipos que lhe foram postos.



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